Euler Acs |
“A unica ditadura que existe na Venezuela é a ditadura da mídia”- afirma Euler Calzadilla , militante do Partido Socialista Unificado da Venezuela.
As eleições municipais no Brasil ocorrem no mesmo dia das eleições presidenciais na Venezuela. Enquanto aqui o processo é marcado pela despolitização do debate, concentrado a discussão em quem faz mais “obras” ou quem é mais “honesto”, o processo eleitoral no país andino é altamente participativo e politizado, mas constantemente ameaçado pelos golpistas orientados por Washington.
Entrevistamos o militante da Corrente Marxista Internacional e do Partido Socialista Unificado da Venezuela (PSUV), Euler Calzadilla de 31 anos, comunicador social e Agrônomo que participa da Frente Bicentenária de empresas controladas pelos trabalhadores.
Esta é a terceira vez que Chávez vai disputar uma eleição após 12 anos no cargo. No entanto, a mídia burguesa no Brasil e no mundo alegam que ele é um ditador, como responder a essas acusações?
A única ditadura que existe na Venezuela é a ditadura da mídia, e isso se reflete internacionalmente nos meios de comunicação. Estes senhores são financiados pelas grandes corporações econômicas, banqueiros e latifundiários e Chávez é uma ameaça aos seus interesses.
Estes são os mesmos meios de comunicação que disseram que Chávez havia renunciado em abril de 2002 durante o golpe. Em dezembro do mesmo ano, estiveram dois meses sem programação, transmitindo 24 horas somente mensagens e chamadas para ignorar o governo e até assassinar o Presidente. É muito comum ver todos os meios de comunicação, nacionais e internacionais, dizendo que na Venezuela existe uma ditadura e que não há liberdade de expressão, mas eles dizem isso desde a Venezuela, transmitem de nossa Assembleia Nacional, eles escrevem o que querem, insultam e atacam sem que nada lhes ocorra. Essa é a melhor prova de que mentem. O fato de que seja a terceira vez que Chávez disputa as eleições e as pessoas irem elegê-lo, é outro exemplo de que não há nenhuma ditadura. Além disso, na metade de seu mandato temos novamente a oportunidade de desencadear um referendo revogatório. Em que país as pessoas têm essas oportunidades?
Chávez terá que competir pelos votos dos "ni ni", como são chamados os eleitores que não decidiram votar “ni” no atual presidente “ni” em Capriles. De acordo com a BBC Brasil, eles fazem parte das classes trabalhadoras, são os eleitores que votaram em Chávez e se abstiveram no último processo, ou não querem voltar ao passado. Esses eleitores podem decidir as eleições, afinal, são a segunda força política na Venezuela? Quem são, na verdade, os "ni ni"?
Os chamados "ni, ni" são de fato a segunda força política. A oposição está dividida em mais de 30 partidos da direita e da extrema direita e disputam os 35% de votos da oposição. No entanto, o nosso país é muito polarizado e politizado, realmente não há espaço para o chamado "ni, ni", existe um histórico de 20% a 25%, que não sai para votar. Do meu ponto de vista a figura do candidato da oposição é irrelevante, ou seja, não importa quem seja, cerca de 80% dos venezuelanos que votam irão fazê-lo a favor ou contra Chávez, não pelo "o candidato da oposição”.
Da mesma forma, o percentual do chamado "ni, ni" consiste em três grupos mais ou menos iguais, aqueles que simplesmente nunca votam por diferentes razões, os chavistas que podem ter entrado em apatia, produto do reformismo e do trabalho duro da burocracia e dos meios de comunicação. Um grupo de oposição que não quer Chávez, mas que não se sentem representados pela burguesia venezuelana. Mesmo eles saindo a votar, não mudaria a tendência, portanto a vantagem de Chávez de acordo com todas as pesquisas e como pode ser visto nas ruas, seria de pelo menos 15%.
O Jornal O Globo publicou uma pesquisa que Chávez perderia para Capriles. Há outras pesquisas publicadas por outros jornais que contradizem essa informação, na verdade, quem está à frente?
Bem, a oposição sempre esteve a favor das pesquisas, quase todas são relacionadas com os seus interesses e pagas por eles, mas, neste caso, todas as pesquisas mostram que Chávez vence por nada menos do que 15%, de modo que jogaram na lixeira todos os pesquisadores reconhecidos e os acusaram de ter se vendido. Contrataram então, pesquisadores fantasmas que não são registrados no poder eleitoral venezuelano, como rege o regulamento eleitoral.
Pesquisadores mais reconhecidos no país e agora não têm lugar nos meios de comunicação privados são: Hinterlaces (agosto): Hugo Chávez 48% e Henrique Capriles 30%, Datanalisis (agosto): Hugo Chávez 43,1% e Henrique Capriles 30 %, o Diretor de GIS XXI, disse que as pesquisas mostram uma diferença favorável a Chávez. O mínimo é 10%, e o máximo é de 20%. Isso é verdade pelo menos nas pesquisas.
Henrique Capriles é apoiado por 33 partidos da direita. Ele foi escolhido por mais de 60% dos votos em uma eleição primária sem precedentes, em que três milhões de pessoas participaram em fevereiro da coalizão de oposição MUD (Mesa da Unidade Democrática). Não é isto uma ameaça para o governo de Chávez? Porque é que a direita participa no processo eleitoral, se eles não acreditam na democracia venezuelana?
Isto é uma contradição deles, em uma suposta ditadura, a oposição realiza uma primária aberta com a colaboração das forças armadas nacionais e contando com o aparato logístico do poder eleitoral, que afirmam não reconhecer os resultados a menos que lhes seja favorável.
Nas primárias do MUD, disseram que haviam participado mais de três milhões. Note que os números nunca foram entregues à CNE (Conselho Nacional Eleitoral) e as eleições foram impugnadas por muitos que estão na "Mesa de Unidade Democrática (MUD)” mais conhecida como a Mesa da extrema-direita, as impugnações se deram por desconfiança de fraude, os tribunais ordenaram uma auditoria de que os líderes do MUD, que responderam queimando os registros da eleição e as atas, portanto, nunca se saberá quantas pessoas participaram e quais foram os resultados.
O que ficou claro é que o poder eleitoral é confiável e que dá maior força ao processo, não há ser ameaça para Chávez ou para qualquer venezuelano.
Henrique Capriles disse que quer fazer um governo semelhante ao de Lula, mais moderado. Se eleito Capriles será um Lula venezuelano? Quais são as suas propostas? Qual é a origem de Capriles?
É verdade, ele declarou isso em várias ocasiões, na tentativa de parecer um político moderado progressista, mas se esqueceu disso em questão de dias. O programa de governo que apresentou ao poder eleitoral representa um retorno ao passado que é vendido como futuro:privatizações, flexibilidade de trabalho, o neoliberalismo, os cortes sociais, etc.. Ele vem da burguesia mais antiquada e reacionária, representa a extrema direita e as suas práticas, desde jovem, estão ligadas a grupos neofascistas, como a Tradição, Família e Propriedade (TFP), estas desempenharam um papel de liderança nos golpes de 2002 e junto a sua mão direita está Leopoldo López que comandou a repressão em Caracas, em 12 e 13 de abril, após a derrubada de Chávez. Quem é a ditadura então?
Muitos dos líderes da oposição, que são de direita, relataram que a execução de tal plano significaria uma guerra civil na Venezuela, porque essas pessoas não vão tolerar que lhes tirem as conquistas sociais alcançadas no calor da revolução. Capriles não seria um Lula venezuelano, de fato, e se tentar um programa como o de Lula, seria retrocesso social importante na Venezuela de hoje.
Para os trabalhadores, quais foram as medidas mais importantes tomadas nesses 12 anos de governo Chávez?
Eu poderia enumerar muitas: saúde, educação, segurança social e reconhecimento, mas o mais importante foi o despertar para a vida política, milhões de venezuelanos que viviam alienados pela TV, pelas loterias e corridas de cavalos, agora são ativistas políticos e sentem que podem participar da sociedade e mudar seu destino. É por isso que a burguesia nacional e internacional não perdoa Chávez.
Um movimento que ganhou apoio na Venezuela é o movimento pelo controle operário. O que este movimento quer e qual o seu papel nesta eleição?
O movimento pelo controle operário nasceu faz dois anos, mas já vinha se desenvolvendo desde greve patronal de 2002, onde Inveval, Gotcha e INAF (Fábricas controladas pelos trabalhadores), tiveram as primeiras experiências de controle das fábricas pelos trabalhadores impulsionadas pela tendência marxista. Agora este é um movimento nacional que está construindo uma alternativa ao modo capitalista de produção por meio dos conselhos dos trabalhadores. Os operários que formam este movimento são ativos em vários dos partidos que apoiam a revolução em grande maioria no PSUV e estão distribuídos por todo o país, chamando a votar em Chávez e assegurar a continuidade da Revolução.
O que são os conselhos operários? O que eles querem?
Os conselhos operários são órgãos de direção dos trabalhadores, não para fins reivindicativos, mas com a posição firme de dirigir as empresas, instituições, fábricas, planejar a aquisição de novos suprimentos, matérias-primas, organização da produção e comercialização dos produtos, mas o mais importante é a abertura dos livros de contas, a ruptura do segredo de comércio e da divisão social do trabalho.
A insegurança é uma questão polemica nesta eleição, como Chávez e Capriles pretendem colocar um fim a isso? O que esse problema significa para a tendência Luta de Classes?
A insegurança é uma questão muito difícil e está sendo usada pela direita como parte da campanha. Chávez tentou aplicar diferentes planos de segurança cidadã e a oposição o acusa de ter falhado. Agora mesmo está trabalhando com uma Missão, "Toda a vida", que planeja abordar o tema de maneira integral e preventiva. De todo modo, a direita acusa Chávez de ser pessoalmente responsável por cada morte no país, mesmo crimes passionais, suicídios e acidentes de trânsito. Em compensação, Capriles é governador do estado Miranda e controla a polícia estadual e é um dos Estados mais inseguros, seguido por quatro outros estados onde os governadores fazem parte de sua coalizão de direita.
A nossa posição como Luta de Classes é que o problema não é apenas na Venezuela, mas em toda a América Latina e ele não pode ser resolvido no âmbito do capitalismo, uma vez que as burguesias, produtores de armas e traficantes de drogas, lucram com a insegurança.
Qual é o papel do PSUV, nesta eleição? E de que forma a tendência intervém nas eleições?
O PSUV é o partido da maioria na Venezuela e é o partido em que milita a maioria dos trabalhadores, sem dúvida será o mais votado. Do nosso ponto de vista, a campanha não teve como centro a luta dos trabalhadores, mas uma campanha de coração e amor. Felizmente os trabalhadores compreendem o seu papel e tem mantido o nível do debate. Nós temos participado nas assembleias e reuniões de trabalhadores impulsionando as discussões e acompanhando a luta dia após dia, o ambiente é muito propício para a crítica e os militantes são muito mais receptivos.
A burocracia estatal na Venezuela é um grande obstáculo para o avanço da revolução. É a grande revolta dos indecisos? Como se pode lutar contra isso?
Definitivamente. Um dos maiores problemas da revolução é a burocracia estatal herdeira da velha política e uma outra parte que tem se desenvolvido nos últimos anos, funcionários que estão na revolução para usufruir dela. Os avanços dos trabalhadores e camponeses põem em jogo seus interesses, por isso se dedicam constantemente em dificultar o processo.
Isto causa um desânimo e apatia dentro de uma camada menos ativa politicamente e este setor é um dos que se abstém de votar. Note-se que nas últimas eleições gerais se viu muito este fenômeno, muitos Chavistas não foram votar pelo burocrata que se apresentava como deputado por estar descontente por sua atuação, mas não é a mesma coisa quando se trata de Chávez, por isso é comum escutar entre os trabalhadores, "eu voto em Chávez, mas não por este outro burocrata que sabota a Revolução”.
Como combatemos isso? Organizando os trabalhadores e pacientemente explicando os fenômenos e desafios da Revolução, o papel que cada um tem que jogar a partir de sua trincheira, eu acho que isso é algo que se compreende bem na Venezuela.
A revolução em Nicarágua foi derrotada nas eleições. Na Venezuela não poderia correr o mesmo risco?
A Revolução Sandinista é um caso com o qual temos muito quem aprender, as lições que deixou deve ser parte da memória histórica dos trabalhadores para evitar a repetição de erros. Nada está descartado neste processo, mas acho que não estamos nessa situação agora, mas poderíamos estar em um futuro. Nossa tarefa é lutar para que isso não aconteça. Eu acredito que os trabalhadores compreendem essa tarefa. Também temos uma situação muito diferente internacionalmente.
Venceremos! Viva o socialismo e a revolução!
Fonte: Esquerda Marxista
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